quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

A Inigualável

Ai, como eu te queria toda de violetas
E flébil de cetim...
Teus dedos longos, de marfim,
Que os sombreassem jóias pretas...

E tão febril e delicada
Que não pudesse dar um passo -
Sonhando estrelas, transtornada,
Com estampas de cor no regaço...

Queria-te nua e friorenta,
Aconchegando-te em zibelinas -
Sonolenta,
Ruiva de éteres e morfinas...

Ah! que as tuas nostalgias fossem guizos de prata -
Teus frenesis, lantejoulas;
E os ócios em que estiolas,
Luar que se desbarata...

Teus beijos, queria-os de tule,
Transparecendo carmim -
Os teus espasmos, de seda...

— Água fria e clara numa noite azul,
Água, devia ser o teu amor por mim...

Mário de Sá-Carneiro

Neste poema, o autor mostra-se na posição de um apaixonado que procura explicar o que sente, através de uma descrição aprofundada dos seus quereres e fantasias diante da mulher amada. Para tal, recorre, por diversas vezes, ao uso da metáfora, comparando a sua amada a coisas raras, valiosas, contraditórias e únicas.
De uma forma peculiar, o amor veste-se de um sentimento que cega e transtorna o amador que, como se pode observar no poema, por vezes, até quer que a sua amada se mostre febril e friorenta.
Como em várias obras de lírica, o poeta dá às palavras o seu próprio significado, reinventando-as em contexto de arrebatamento amoroso, criando novos sentidos que expressam o seu sentir, o seu desejo e o seu querer, nem sempre entendido ou correspondido.
Este sentimento é algo que não pode ter qualquer significado objetivo, é algo que só pode dizer-se quando o eco sai de dentro de nós sob a forma de palavras. O amor é sempre subjetivo, para se compreender tem de se sentir e viver. Cristaliza uma emoção que varia de pessoa para pessoa, criando estados de espírito confusos, sentimentos contraditórios, ansiedade, bloqueios, inibições, comportamentos excessivos e exacerbados mas que, na minha opinião, é crucial para a vida e para nos sentirmos vivos pois sem ele apenas seríamos seres amorfos, limitados, monocromáticos como pedras incapazes de movimento.


David Barroso, 10º C

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