terça-feira, 4 de março de 2014

Nesta última tarde em que respiro:

Neste poema de António Franco Alexandre somos desde o primeiro verso confrontados com uma circunstância de morte.

Essa ideia é reforçada a partir da metáfora posteriormente apresentada na qual um pequeno feixe de luz se vai desvanecendo com o tempo, o tempo acaba por se esgotar e o último raio de luz dissipa-se no horizonte, acabando por desaparecer.

Quando chega a hora de partir vêm-nos inevitavelmente ao pensamento as melhores recordações do passado, bem como as nossas intenções que já não poderemos realizar no futuro, um contraste eminente entre uma mistura de paz e revolta.

Fica no ar a esperança por um amor com o qual a personagem prestes a deixar o mundo não teve possibilidade de conviver durante a sua vida terrena. Mas a lembrança e saudade por um amor há muito procurado, é impossível de se perder e deixar cair no esquecimento profundo.

O amor do poeta vai muito além da imaginação, duma rima vulgar de um cantor sem voz e sem alma, pois se assim fossem nem os poemas nem nada faria sentido, tudo seria em vão.


Visto isto, o poeta nunca poderá deixar de acreditar e ter esperanças de, um dia, vir a estar frente a frente com a sua amada num futuro diferente, noutro mundo, noutra dimensão.

Um mover d'olhos brando e piadoso
O poema é um soneto, pois é constituído por duas quadras e dois tercetos, tem versos decassilábicos, típico de Camões, com esquema rimático: ABBA///ABBA//CDE//CDE.
O soneto apresenta um retrato da mulher amada tendo como base a perspetiva Petrarquista. O conjunto de qualidades que lhe é dado tende a produzir uma imagem de perfeição e a não individualização da mulher.
Este poema está dividido em duas partes:
- A primeira parte é o conjunto das duas quadras e do primeiro terceto que correspondem à acumulação de atributos físicos e morais da figura feminina. São feitas referências ao “mover d’olhos”, ao “sorriso”, ao “gesto”, às quais são atribuídas qualidades morais: “Um mover d’olhos brando e piadoso,”, “um sorriso brando e honesto,” e “um doce e humilde gesto,”.

- A segunda parte é constituída pelo último terceto e corresponde à compilação de todos esses atributos reunidos na expressão “celeste fermosura”, que, além da beleza, remete para o carácter divino da mulher. Esta é também, metaforicamente, apresentada como Circe, ou seja, uma feiticeira que encanta o poeta como seu veneno, isto é, a sua perfeição, que seduz o poeta e lhe invade o pensamento.