Um Fado: Palavras Minhas
Palavras que disseste e já não dizes,
palavras como um sol que me queimava,
olhos loucos de um vento que soprava
em olhos que eram meus, e mais felizes.
Palavras que disseste e que diziam
segredos que eram lentas madrugadas,
promessas imperfeitas, murmuradas
enquanto os nossos beijos permitiam.
Palavras que dizias, sem sentido,
sem as quereres, mas só porque eram elas
que traziam a calma das estrelas
à noite que assomava ao meu ouvido...
Palavras que não dizes, nem são tuas,
que morreram, que em ti já não existem
— que são minhas, só minhas, pois persistem
na memória que arrasto pelas ruas.
Pedro Tamen
Neste poema, a temática do amor é explorada na perspetiva deste sentimento enquanto algo capaz de transformar profundamente a existência do "eu". Neste caso, a recordação do passado está, afinal, bastante presente na vida do sujeito poético.
A repetição do mesmo início em cada estrofe, põem em evidência a recordação intensa das palavras que eram ditas.
As palavras proferidas, à distância, pela amada, eram carregadas de um sentido profundo, sendo capazes de criar um mundo perfeito.
A "palavra" tem repetidamente, em todo o poema, um significado muito para além daquele que lhe podemos atribuir num sentido denotativo - as palavras que o "eu" ouvia transmitiam a ideia da profunda e perfeita ligação entre os dois, através delas, a amada transformava o mundo do sujeito lírico num mundo calmo.
Porém, na última estrofe, torna-se claro que o sujeito poético e a pessoa com quem partilhava o amor já não estão juntos. Sem sabermos a razão dessa ausência, percebemos claramente que o sujeito lírico continua a recordar as palavras que ouvia.
No presente, essa recordação poderá ser a única força que tem para continuar a enfrentar as dificuldades.
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