(Creio que não tenho história de vida suficiente para fazer uma autobiografia,
mas aqui vai:)
Nasci no
hospital São Francisco Xavier, parto sem problemas, peso e altura normais para
um recém-nascido. Fiz os testes que deveria fazer, e aí fui rotulado.
Desde
sempre que fui uma criança diferente, sempre fui um inadaptado na sociedade e
sempre serei, porque tenho um distúrbio mental que vem comigo desde a nascença.
Aprendi a
ler e a escrever bastante cedo, com quatro anos. Aos cinco anos já fazia
multiplicações e fazia a tabuada com facilidade. As pessoas viam-me como um
sobredotado (algo que não era), e isso foi afastando-as gradualmente, a meu
ver. Fiz amizades dificilmente por causa da minha falta de capacidade de
socializar, e parecendo que não, isso marca uma pessoa por dentro.
Os anos que
passaram foram um misto de felicidade e tristeza. A minha inteligência, ao que
parece, acima da média, permitiu-me não fazer o segundo ano de escolaridade.
Não foi fácil, demorei anos a adaptar-me, a conviver com pessoas mais velhas,
que me viam com diferença e com algum desprezo. Foi aí que percebi a minha
inadequação em relação ao mundo e ao suposto protótipo da criança do século
XXI. Fui a psicólogos e tinham todos a mesma opinião acerca de mim: era
diferente.
Foram anos difíceis,
em que sem sabendo, procurava persistentemente a paz em mim. Anos em que sofri bullying, em que me sentia miserável, em
que demorava em entender o porquê de eu ser como era. Ainda não sabia quem eu
era, e isso causava uma inquietação em mim que me tirava a autoestima
facilmente.
Só no ano
passado encontrei a paz que teimava em ser encontrada. Conheci melhor as
pessoas certas, soltei-me, fui de pés juntos em direção ao desconhecido. É um
sentimento que poucas pessoas como eu conseguem ter, porque é difícil obtê-lo.
Senti emoções que já deveria ter sentido há muito tempo, senti o que era o
amor, a amizade, e é uma liberdade que sabe bem.
Nem tudo o
que é bom dura, no entanto. Essa liberdade terminou quando mudei para o ensino
secundário e para uma nova escola. É uma nova realidade, e aí volto a
questionar-me quem realmente sou eu. E creio que demorarei a descobrir isso. Mas
só tenho catorze anos, há tempo suficiente.
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